O Furo Jornalístico
Luciano Junior
Dizem que a Bahia tem um ritmo próprio. Um tempo elástico, quase musical, em que até a curiosidade anda descalça e assovia.
Minha passagem por lá me trouxe muitas alegrias — amizades sinceras, abraços com sotaque e histórias… ah, as histórias!
Algumas vivi. Outras me contaram. E há as que ninguém sabe exatamente se aconteceram, mas todo mundo jura que sim. Essa é uma delas.
Conversava eu hoje com Celsinho Xavier, amigo querido e fonte confiável de histórias que nem o Google tem. No meio da conversa, ele lançou:
— Rapaz, tu lembra do meu irmão?
— Qual deles?
— O repórter investigativo…
— O quê?
— Deixa eu te contar...
Segundo Celsinho, seu irmão — cujo nome manteremos em segredo por segurança emocional e possíveis represálias familiares — era o tipo de criança que se interessava por tudo. Desde o funcionamento da descarga até o que havia por trás de uma nuvem. Um curioso inveterado, quase um Sherlock Holmes mirim de chinelo Rider.
Numa tarde qualquer, a família Xavier voltava para casa, provavelmente pela Getúlio Vargas, com o pai dirigindo em modo “ignorar perguntas por sobrevivência”. O carro seguia sereno quando o pequeno investigador, de longas madeixas, avistou uma aglomeração de pessoas. Na Bahia, isso pode significar qualquer coisa: um trio elétrico, um bloco de capoeira, uma briga de dominó ou um acarajé que explodiu de tanta pimenta.
O menino imediatamente entrou em modo “plantão da Globo”:
— Pai! Para! Olha ali! Aglomeração!
— Fica quieto, menino!
— Mas pai! Pode ser um crime, um acidente, um... um ET!
— ET mora na Lua, menino. Cala a boca.
Chegando em casa, enquanto todos desciam calmamente, o pequeno Celsinho-irmão já lançava seu “modo repórter da GloboNews”, pulando do carro com um “eu volto já” que lembrava até novela mexicana. Saiu correndo em busca da verdade.
Horas depois — provavelmente já com uma reprimenda garantida, um sermão e um “fica de castigo sem ver TVE” — ele retorna.
Cabisbaixo. Sem furos jornalÍsticos. Sem manchetes. Só com uma verdade nua, crua e tragicômica:
— Era um ponto de ônibus novo... A cidade começava a ter transporte público da empresa de Manoel Barros que antecedeu a Vitran.
Diante da revelação, a casa caiu. De tanto rirem.
O pai gargalhou. A mãe teve que sentar. Celsinho, que mal sabia falar, repetia só “ô-nibus! ô-nibus!” como se fosse a coisa mais engraçada do universo — e naquele momento, era mesmo.
E desde então, naquela casa baiana, todo início de tumulto ou ajuntamento gerava um alerta:
— Olha ali, deve ser outro ponto de ônibus!
E o irmão, agora crescido, ainda carrega o título de primeiro jornalista da família — embora tenha se aposentado precocemente depois de seu épico fracasso investigativo.
Porque na Bahia, até as histórias mais simples têm sabor. E até os pontos de ônibus têm fama.