O dilema (ou os entraves?) da Comunicação em Paulo Afonso...
Que valor se tem dado às várias formas de comunicação em Paulo Afonso?
- Brevíssima história da comunicação em Paulo Afonso -
Antônio Galdino
Terminei há pouco de ler o livro CHATÔ o rei do Brasil, de Fernando Morais, livrinho pequeno, de apenas 736 páginas, que conta a história de Assis Chateaubriand, o criador dos Diários Associados, jornais, rádios e emissoras de televisão, iniciado com O Jornal, do Rio de Janeiro, cem anos atrás, em 1924, com muita luta, perseguições políticas e fico me perguntando?
Porque muitos governantes têm tanto medo da imprensa? Ouvi falar de governos atuais do Brasil que até exigem que antes de serem publicados os textos, as matérias jornalísticas precisam passar pela avaliação de assessores de comunicação...
Também ouvi falar que um governador da Paraíba fez o melhor governo daquele Estado porque costumava ler justamente os jornais de oposição que apontavam erros que os jornais da situação, do governo procuravam esconder...
Voltou a censura? O controle do que a imprensa deve dizer ou não, como nos tempos de Chateaubriand? Ou não bastam as pandemias como a Covid-19 para reduzir a capacidade de sobrevivência de muitos veículos de comunicação?...
Houve um tempo em que a comunicação no Brasil era coisa de alguns poderosos e amigos do rei, se o Brasil tivesse reinado...
E continuo me questionando...
Porque, em alguns lugares, os governos prestigiam apenas alguns veículos de comunicação e deixam que outros morram por inanição, falta de alimento financeiro para pagar todas as suas contas, inclusive os muitos impostos municipais, estaduais e federais? Isso, embora seja tratado com outros nomes, não deixa de ser a volta da censura...
Com esses pensamentos fiz uma viagem ao passado em Paulo Afonso.
Gilberto Leal e A Voz do Povo
No tempo do governo militar criaram-se regras de controle da radiodifusão no país. Em Paulo Afonso, a comunicação era feita pelos Serviços de Alto-Falantes Miramar, de Salvino e A Voz do Povo, de Gilberto Leal. Começaram a aparecer os carros de som, anunciando o que se poderia encontrar nas lojas da Rua da Frente (Av. Getúlio Vargas) às mortes e missas de 7º dia, um mês, um ano, com a voz empostada do locutor e uma música fúnebre de fundo...
E, naturalmente, havia censura forte. Lembro que uma vez o Serviço de Alto Falantes A Voz do Povo, de Gilberto Leal, instalado na sala de projeção do Cine São Francisco estava tocando algumas musicas aos cuidados de um ajudante de Gilberto Leal que precisou ir a uma loja ali perto. O ajudante colocou pra tocar um disco pequeno, de apenas duas faixas de cada lado e se distraiu. Terminou a primeira faixa, entrou a segunda “Caminhando e cantando e seguindo a canção / Somos todos iguais, braços dados ou não”. A música Pra não dizer que não falei das flores, de Geraldo Vandré, censurada pelo governo militar, invadiu as ruas de Paulo Afonso. Quando Gilberto Leal ouviu, saiu em disparada na direção do seu estúdio... O Exército chegou primeiro e apreendeu o disco...
Mário Santos (à direita) e a Rádio Poty
Djaci Oliveira, Saul Camboin e Roque Leonardo - comunicadores pauloafonsinos
Por esse tempo, Antônio Bernardo, Raimundo e Mário Santos criaram a Rádio Poty que, tempos depois foi negociada e passou a ser administrada por Roque Leonardo. E a Rádio Poty foi um fenômeno em Paulo Afonso, onde Antônio Galdino, Antônio José Diniz, Edemir Rodrigues, dentre outros, estivemos por uns tempos. Foi nossa escola.
Mas, o governo militar, ao criar o Departamento Nacional de Telecomunicações, - DENTEL – passou a ter o controle sobre a radiodifusão no país e a fechar aquelas rádios que existiam antes e foram consideradas ilegais, como foi o caso da Rádio Poty e para se instalar uma rádio em uma cidade, as exigências eram enormes.
Foi o caso da Rádio Cultura de Paulo Afonso, um sonho antigo de Antônio José Diniz. Acompanhei de perto essa luta, de anos, para preencher todas as exigências do governo federal. Investimentos altos em equipamentos, projeto elaborado precisou ser acompanhado por um engenheiro da área. Tudo muito fiscalizado... Foram uns dois anos de idas e vindas a Brasília até que em 8 de dezembro de 1978, há mais de 46 anos, com a bênção do primeiro bispo de Paulo Afonso, D. Jackson Berenguer Prado, a Rádio Cultura foi colocada no ar, ao som da música Paulo Afonso, de Luiz Gonzaga.
Um pioneiro de Paulo Afonso, o Sr. Nicolson Machado Chaves correu para cumprimentar Diniz e eufórico, emocionado, dizia forte: “Diniz, você deu voz a Paulo Afonso!”.
Fábio Salvador (à esquerda) - Rádio Bahia Nordeste
Nove anos depois, em outubro de 1987, nasceu a Rádio Bahia Nordeste. Uma inciativa de Luiz de Deus, Délcio Ferreira, Alonso Maciel e José de Matos Brito. Eu estava por lá, ajudando, colaborando...
Paulo Afonso ter voz por esses sertões, era esse o sentimento de todos os pauloafonsinos, prefeito, vereadores, populares, estudantes, empresários, comerciantes. As ações do governo municipal, os produtos do comércio local podiam ser conhecidos por muito gente... Os moradores da zona rural, habituaram-se a acordar ao som da música nordestina, os amantes do futebol podiam acompanhar a trajetória dos seus times preferidos e os jogos da seleção de Paulo Afonso no Intermunicipal... Pelas ondas do rádio, como diziam os saudosos Nilson Brandão e Rosalvo Soares e também Djalma Nobre (que mora em Lagoinha, povoado de Delmiro Gouveia), Carlos Rodrigues, Saul Camboin, Belmiro Deusdete, Antônio Galdino e muitos outros locutores da época, desse começo...
Mais recentemente, o que foi tão exigente, complicado e difícil no começo, afrouxou... abriram-se espaços para as Rádios comunitárias, de ação limitada a um raio de quilômetro, que muitos não obedecem, e a sua existência está ligada a uma associação de Bairro, tanto que as três existentes em Paulo Afonso, as Rádios Betânia (no Sal Torrado), Betel (na Prainha) e BTN (no BTN), têm a mesma frequência: 104,9.
Aí veio a internet aberta e surgiram as Rádios Web - Seliganamúsica, Caiçara, e as redes sociais invadiam todos os lugares, tudo isso com investimento bem pequeno... E vieram os sites que são também veiculadores de notícias, agentes de comunicação...
Para que estas rádios pioneiras, de grande investimento dos empresários empreendedores da época se mantenham prestando esse serviço essencial ao município, pagando os seus empregados, adquirindo equipamentos caros e fazendo a sua manutenção regular, tem-se recorrido aos apoios publicitários do comércio e dos órgãos institucionais – prefeitura, câmaras de vereadores, principalmente, que possuem em seus orçamentos valores grandes para tal fim. Disso também sobrevive o único Jornal do município, da região, que sobrevive a duras penas, há mais de 21 anos...
O ano passado foi divulgado por um vereador que em um dos quadriênios da gestão, foram aplicados 1,6 milhão em publicidade...
O
fato é que, ao longo da história do município, dezenas de jornais, revistas e
outras publicações deixaram de existir por falta da sensibilidade dos gestores
em apoiarem esses veículos, que divulgavam este município, fazendo esse dinheiro
girar a economia do próprio município.
O Jornal Folha Sertaneja, sobrevivente há mais de 21 anos nunca sabe se terá a edição do mês seguinte, mesmo online e os boletos de impostos não param de chegar...
Também as rádios Cultura e Bahia Nordeste passam por momentos de dificuldades porque, além do comércio, os órgãos que mais podem contribuir para a manutenção de suas programações em alto nível, a prefeitura e a câmara de vereadores, o governo do Estado, faz tempo que não estão sensíveis a essa realidade. Ou o que se pode dizer? O governo do Estado também já publicou no jornal suas mensagens...
O prefeito e o presidente da Câmara dizem que ainda não foi contratada a Agência de Publicidade para administrar a comunicação nesses órgãos. Tudo bem. E quando isso acontecerá?
A internet, usada sem compromisso, facilita a comunicação interpessoal e dela também se valem as rádios e as mensagens comerciais, assim como as realizações da gestão municipal, da câmara de vereadores, passam também a correr pelo mundo.
Lembro que, ao participar de um programa na Rádio Cultura quando falava da história de Paulo Afonso, o telefone do estúdio tocou. Era o amigo/irmão, Professor Francisco Nery. Só que ele estava ligando de Toulousse, na França...
As rádios, que exigiram grandes investimentos em equipamentos e precisam pagar seus bons comunicadores e manter seus equipamentos e uma programação variada e popular registram a ação imediata, a informação quente, do momento e alcançam milhares de ouvintes...
Assim também os jornais, como o Folha Sertaneja, que criei e dirijo desde 18 de janeiro de 2004, registram a história recente em documento que pode ser consultado sempre além de buscar o resgate da memória viva desse lugar. E ele é o único que sobrou de tantos outros jornais e revistas que já passaram por aqui... E para mantê-lo tem sido uma luta... sempre.
Ao que parece, esses cuidados, investimentos, tanto trabalho, não parece merecer mais a atenção de políticos importantes, gestores municipais, legisladores do município.
Fica mesmo o sentimento que, passadas as eleições, vem o descarte...
Será que está voltando o tempo da censura, do revanchismo, ou não vale mais o “Artigo 5º da Constituição Federal Brasileira, que estabelece o princípio da igualdade perante a lei, garante que todos, sem distinção de qualquer natureza, são tratados de forma igualitária pela lei.”
Fico pensando porque tantos jornais e revistas já existiram em Paulo Afonso e não sobreviveram?
Estou concluindo essa reflexão quando Zé de Tonha, que estava de olho no que eu escrevia, me puxa pelo braço e diz....
- “Oxente, rapaz, vixe... se a coisa continuar assim, vai-se acabar é tudo... rádio, jornal... Eita... Mas, num se aperreei, não se avexe não... E ouça essa música que tá tocando na rádio ...
Zé de Tonha colocou o radinho na mesa e escapuliu... E a bela voz de Simone invadiu a sala...
“Como será o amanhã?
Responda quem puder
O que irá me acontecer?
O meu destino será
Como Deus quiser...”
EXCELENTE COMENTÁRIO ONDE ENTRE ALGUNS NOMES O MEU FOI CITADO E AGRADEÇO POR HAVER SIDO LEMBRADO.