O ano era o terceiro do segundo grau. A primeira aula era de inglês e eu estava atrasado. A professora já havia lido o texto e oferecia um dez a quem, em inglês, fizesse um resumo do texto escutado. Na ausência de um intrépido necessitado de nota, me ofereci eu. "Posso tentar, quem sabe", e ela, surpresa - eu tinha ido com todo o cuidado estudado dos símplices -. teve a paciência e o pudor de ler o texto novamente, desta vez só para mim. A tensão, obviamente, aumentou - para mim e para todos.
Tratava-se de um personagem caolho. Ele só enxergava com um olho. O homem era one-eyed! O bullying era ainda brabo e o coitado sofria - e se resignava. Veio o texto remidor ou a chance de virar a mesa. Sair por cima. E ele acuou os seus algozes: "Na realidade, eu tenho muita sorte. Posso até me considerar superior a vocês. Enquanto eu, com um só olho, posso enxergar dois olhos na face de vocês, vocês, com dois olhos, só podem enxergar apenas um na minha."
Ganhei meu dez já no final do meu curso. De passagem, elogios desnecessários de serem lembrados, eu na realidade acabrunhado - os olhos de todos sobre mim -, a professora, cheia de consciência pedagógica, dever de mestra cumprido, avidamente abriu a caderneta e lavrou o bendito dez. Ainda me lembra a sua expressão de satisfação.
O resumo oral (para os amantes de inglês) deve ter sido algo como: "I have heard about a man who was one-eyed. Tired of being mocked and teased, he just retorted: Fact is that I may be very lucky. I may even consider myself much better than you. While I, with just one eye, can see your two eyes, you, with your two eyes, can only see one eye on my face".
Bem-aventurado quem tem leitores com quem compartilhar memórias inesquecíveis.
Francico Nery Júnior